14 MAI 2021
REDAÇÃO
O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP) decidiu manter a anulação do negócio jurídico que resultou no pagamento de 20% da área do Clube Atlético Sorocabano de Itapetininga (Casi), como honorários advocatícios, para os advogados Hermelino de Oliveira Graça e João Ricardo Baracho Navas. No dia 24 de fevereiro deste ano, o desembargador Lino Machado negou recurso dos dois advogados e determinou que a área seja retomada pelo clube. Após a decisão, a atual diretoria do Casi ingressou com execução provisória para retomada da área. Da decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, ainda cabe recurso ao STJ.
O desembargador seguiu o entendimento da juíza Vilma Tomaz Lourenço Ferreira Zanini, da 4ª Vara Cível de Itapetininga, que no ano passado julgou procedente a ação da atual diretoria do clube para declarar a nulidade parcial do contrato firmado entre o Casi e o advogado Hermelino de Oliveira Graça, apenas no que tange à forma de pagamento dos honorários advocatícios, ou seja, através da entrega de percentual da área. O advogado foi contratado por antiga diretoria do clube, para ajuizar uma ação de usucapião para o clube obter o imóvel. Após ganhar a ação, o advogado cobrou como pagamento 20% da área do clube como honorários advocatícios. A área foi avaliada em aproximadamente R$ 10 milhões.
Segundo a Justiça, no entanto, a forma do pagamento com parte do imóvel foi realizada em desconformidade com o Estatuto Social do clube, segundo o qual havia necessidade de Assembleia Geral. A Justiça também declarou nulo todos os atos decorrentes dessa ação, com os registros efetivados na matrícula do imóvel e também a anulação de eventuais matrículas abertas em nome dos advogados junto ao Cartório de Registro de Imóveis. Também determinou a retomada do bem, na sua totalidade, exclusivamente ao clube. Além disso, os advogados devem arcar com as custas e despesas processuais.
No recurso julgado improcedente pelo TJ-SP, o advogado Hermelino Oliveira Graça alegou ocorrência de decadência; no mérito, em síntese, a ausência de patrimônio à época da assinatura do contrato; a inexistência de nulidade e de prejuízo; a aplicação da teoria da aparência; a boa-fé objetiva; a higidez e validade do negócio jurídico; a torpeza do autor. Pediu também a improcedência da ação e a condenação do autor à multa por litigância de má fé.
Já o advogado João Ricardo Baracho Navas pediu improcedência da ação alegando cerceamento de defesa em relação à ausência de apresentação do contrato firmado entre o clube e o advogado Hermelino; a ocorrência de decadência; sua ilegitimidade para figurar no polo passivo; a inépcia da inicial; e no mérito, em síntese, a regularidade e validade do acordo; a má-fé do autor; a aplicação da teoria da aparência; a boa-fé objetiva.
Segundo o desembargador, “como bem destacado na sentença, o negócio jurídico de dação em pagamento foi realizado em desconformidade com o Estatuto Social do autor, segundo o qual havia necessidade de Assembleia Geral. “Nesse ínterim, o negócio não poderia ser convalidado e sua nulidade poderia ser arguida a qualquer tempo, fato que por si só afasta as alegações de aplicação de teoria da aparência, boa fé objetiva, torpeza do autor e validade do negócio”, afirma o desembargador Lino Machado.
Segundo ele, os apelantes, na qualidade de operadores de direito e conhecedores das normas jurídicas, deveriam ter se precavido, sobretudo quanto às regras do Estatuto Social, quando da elaboração do acordo. “Em relação à ilegitimidade passiva, não tem razão o apelante João Ricardo. Isso porque, como bem afirmou o douto magistrado, possui vínculo direto com a relação jurídica trazida aos autos. Também não têm razão quanto à alegação de inépcia da inicial, pois o pedido e a causa de pedir são certos, a conclusão decorre logicamente da narração dos fatos e o pedido é juridicamente possível. Ademais, o suposto erro de nomenclatura dada à ação não é causa suficiente para se acatar a tese de petição inepta”, diz o acórdão.
O desembargador continua. “Não se vislumbra má-fé do autor. A configuração da má-fé exige vontade inequívoca de praticar os atos revistos na norma disposta no artigo 80, do CPC, os quais não se observam no presente caso. Cabe destacar que nada obsta que a remuneração dos serviços advocatícios prestados pelo réu possa ser pleiteada pela via adequada”, registra.
No acórdão, o desembargador Lino Machado também afirma que a manifestação de João Ricardo Baracho Navas com pedido de suspensão do julgamento não merece acolhimento. “Isso porque observa-se que nos autos houve a nomeação judicial do administrador do Clube. A discordância com o referido julgamento deve ser arguida pela via adequada naqueles autos”, diz o acórdão.
Sobre o pedido de suspensão da decisão, o desembargador afirma que ainda não houve julgamento em primeiro grau da ação na qual se discute a nomeação do administrador e anulação da eleição da representante do clube. “Logo, ausente a coisa julgada, não há razão para suspensão do presente feito, sendo certo que, igualmente, eventual discordância deve ser discutida naqueles autos”, concluiu.
Clube perdeu contratos e ficou no prejuízo, segundo advogado do CASI
Com a transferência de posse da área aos advogado, o clube teve prejuízos, segundo o advogado do Casi, Eduardo Bicudo. “Na área que foi transmitida a posse aos advogados, foi construído um muro que causou a destruição da histórica pista de atletismo e a inviabilização do uso do campo de futebol, já que o mato cortou parte do campo e o espaço restante não comporta as medidas oficiais de um campo. Além disso, na área onde foi instalado um ‘shopping’, antes era locada pelo clube, o que gerava uma renda que hoje faz muita falta para a administração do CASI”, afirma.
Segundo o advogado, a área que foi paga aos advogados está no ponto mais estratégico do clube, na esquina entre a Rua Padre Albuquerque. “No local funciona um centro comercial e a outra área tem parte alugada para outra empresa ”, afirmou o advogado.
A nova diretoria do clube também cobra na Justiça cerca de R$ 150 mil reais da antiga gestora do clube. A ação já foi transitada em julgado e está em fase de execução. Segundo o advogado Eduardo Bicudo, a antiga diretoria recebia recursos provenientes de locações da área do clube durante anos, mas não comprovou no processo de prestação de contas que o dinheiro foi destinado ao Clube. “Nos autos do processo ficou claro que não existia prestação de contas no Clube durante os anos de 2012 a 2018, conforme estabelece o Estatuto da Associação. Durante esse período também não houve investimentos no Clube”, afirma.
Nota do advogado Hermelino de Oliveira Graça
O Clube Atlético Sorocabano foi fundado por ferroviários que desde a década de quarenta, época da Estrada de Ferro Sorocabana, utilizavam um campo de futebol situado no Bairro da Aparecida e emprestado do Governo do Estado de São Paulo.
O Clube através de suas Diretorias renovava seu contrato de comodato com o Governo do Estado, até que, em fevereiro de 1995 o CASI foi notificado judicialmente para devolver a área, em 30 dias. Desde a década de 1.940 os diretores tentavam de tudo para conseguir a
propriedade do patrimônio. E nada conseguiram. Todos políticos itapetininganos (prefeitos, vereadores e deputados) fracassaram na tentativa de que o Estado doasse a área ao clube de futebol. O deputado Ciro Albuquerque, na qualidade de Presidente da Assembleia Legislativa na época, chegou a elaborar um Decreto Legislativo para a outorga de propriedade ao CASI, mas também fracassou. Enfim, o imóvel continuava a não
ser do CASI.
Com o risco do Clube ser extinto após o despejo, inúmeros advogados foram consultados na região. E ninguém quis aceitar a causa do Clube. Foi quando, como último fio de
esperança, contataram Hermelino de Oliveira Graça, conhecido advogado, na época Presidente da Ordem dos Advogados local e professor da Faculdade de Direito local.
E assim, sem qualquer recurso e apesar da dificuldade e mínima possibilidade de
ganho, o advogado aceitou elaborar um contrato de risco. Ou seja, se ganhasse a demanda teria direito a 20% do benefício obtido (valor do imóvel). Se perdesse nada ganharia.
Como primeiro passo do trabalho, administrativamente o profissional conseguiu adiar
o despejo. E nesse ínterim o Governo do Estado de São Paulo para quitar uma dívida, transferia o imóvel ao Governo Federal.
Em 1998 o advogado iniciara um usucapião contencioso tentando o impossível, ou
seja, obter a área para o Clube. E por fim, depois de anos de demanda o advogado conseguira a vitória, e entregava ao clube um imóvel devidamente registrado (registro pago pelo próprio profissional). O CASI enfim, tinha um bem.
No entanto o clube, após sair vitorioso, negou-se a cumprir a obrigação assumida por contrato escrito, negando-se a pagar o profissional que conseguiu o milagre de obter tão
esperado patrimônio. Assim, o profissional foi obrigado a ajuizar ação para fazer o Clube cumprir sua obrigação, objetivando receber os 20% de honorários com juros, correção e multa. Depois de anos, já desgastado, o advogado aceitou proposta do Clube e recebeu bem menos do que estava previsto e em terreno.
O Clube obteve a anulação de apenas uma das cláusulas contratuais que dispunha sobre a possibilidade de se pagar em imóvel. No entanto, o contrato de honorários foi Julgado válido, e a dívida deverá ser paga em dinheiro. Dessa forma, persistindo a dívida, que agora sofrerá correção e juros retroativos, o clube não terá condições de pagá-la.
Como se vê, o Clube será prejudicado. E assim, a nova Diretoria coloca em risco o atual patrimônio do clube, que certamente será objeto de futuro leilão judicial.
Ai a chamada “Vitória de Pirro”, afinal foi conseguida por um preço muito alto, podendo
causar danos irreparáveis. Enfim, os diretores precisam entender é que, o patrimônio só existe graças ao trabalho admirável do competente profissional e que deve ser recompensado.
A reportagem não conseguiu contato com o advogado João Ricardo Baracho Navas.








