04 AGO 2020
PADRE REINALDO RAMOS
Há muito tempo a humanidade viveu a chamada Cristandade. Um período em que o Estado interferia diretamente nas questões religiosas e a Igreja determinava a vida civil com seu poder religioso. Pode-se, ainda hoje, supor como consequência a prevalência de muitos conflitos.
A questão girava em torno de quem mandava mais. Cada poder constituído reclamava para si a legitimidade de sua suprema autoridade sobre os demais poderes.
Com a consolidação do Estado moderno, o poder religioso foi relegado ao plano puramente espiritual, com o Estado ocupando-se plenamente da vida civil. De uma sociedade que respirava religião passou-se a uma sociedade dominada pela racionalidade.
Não é de se espantar que, em certos momentos, as competências próprias de cada instância não foram respeitadas. Isso continua a acontecer quando o Estado, obscurecendo a dimensão religiosa do seu povo, afirma o laicismo, reforçando a indiferença religiosa.
Por outro lado, exige-se da Igreja, falo da Igreja Católica, a capacidade de diálogo numa sociedade totalmente plural. A Igreja não pode pretender legislar sobre as questões civis e nem tampouco reger o poder estatal.
Ponderadas essas coisas, há que buscar uma solução para os conflitos originantes de inferências indevidas entre os poderes aqui citados. Num Estado democrático há que se garantir a liberdade de expressão como participação democrática de todos os componentes.
Num Estado democrático é válida e legítima qualquer forma de participação. Nenhuma idéia ou crítica deve ser “terroristicamente” abatida. E não deverá ocorrer imposições e domínios que, sem dúvidas, fragilizariam a própria democracia.
Espera-se que a sociedade de hoje reconheça o papel fundamental da religião como um bem para o homem; que o Estado continue a tutelar o bem das religiões. Espera-se que a Igreja, tal qual outras instituições, tenha o seu direito de expressão garantida, nas mais diferentes matérias, inclusive na dimensão política e social.
Que a Igreja deva cuidar das coisas espirituais é verdade, mas também é verdade que não poderá ser indiferente aos sofrimentos dos cidadãos. Se o cidadão sofre é a Igreja quem sofre. E tudo aquilo que fere o cidadão, fere o homem e fere igualmente a Igreja, porque homem, cidadão ou religioso, é a finalidade da Igreja.